sábado, 24 de fevereiro de 2018

"Gotas de júpiter..."


Era noite e chovia enquanto eu caminhava pela avenida principal da cidade. Eu era a única a andar a pé por aquelas bandas. Aparentemente, era também a única louca sem carro a caminhar com uma sacola cheia de besteiras debaixo de chuva e passando frio.

Mas antes que me perguntem, eu não estava "apreciando o momento".

Aquilo era apenas a consequência de um infortúnio com a internet do meu celular. Quer uma dica? Escolha o seu próprio plano de internet e arque com os custos. Vai sair mais barato do que o perrengue de ficar sem carona e sem táxi de volta pra casa.

Eu não consegui chamar o Uber, e então comecei a vagar pelo o que acreditei ser a direção certa da casa onde estou morando, sabendo, é claro, que estava muito distante, mas sem desistir de caçar um táxi.

Port Jefferson tem sido a minha cidade há 3 semanas. É uma daquelas cidades americanas minúsculas, litorâneas, feitas para concentrar a maior parte da diversão no verão. Mas ainda estamos no inverno, então a praia e todas as várias sorveterias espalhadas por aqui não têm lá muita graça.

Se alguém me dissesse há um ano que hoje eu estaria perdida numa cidadezinha americana, sem internet e debaixo da chuva, eu provavelmente daria risada. Esse foi um dos meus vários pensamentos durante minha curta jornada em direção ao Dunkin Donuts mais próximo para usar o Wifi.

Na hora do perrengue, é difícil ficar buscando os lados positivos da situação. O máximo de positividade que consigo extrair dos micos que paguei é saber que daqui há um tempo eu estarei rindo deles durante uma conversa descontraída com amigos. E é isso.

Mas quando eu cheguei  na cafeteria e tentei diversas vezes acessar o wifi - que a propósito não queria funcionar - eu só tive vontade de reclamar da vida mesmo. É aquela hora boba que a gente esquece do quanto conquistou e se pergunta porque não continuou quietinha, confortável no quarto, no nosso mundinho, com pessoas que falam a mesma língua e com um razoável plano 3g do Brasil.

De repente, uma música começa a tocar pelos alto-falantes. Não é só uma música, é a MINHA música. A música que eu decretei como a trilha sonora da minha vida.

"Drops of Jupiter", do Train, começou a tocar. Um sorriso involuntário surgiu nos meus lábios. Era quase como se todo o meu corpo já tivesse uma reação imediata àquela melodia. Eu olhei para o copo de café nas minhas mãos, eu vi o meu reflexo no vidro. Aquela era eu, escrevendo a minha história enquanto a vida me surpreendia com sinais sutis, como se dissesse: "Aproveite o momento, aproveite o som, curta seu café e, por favor, cale a boca!".

Comecei a cantar, feliz por não ter muita platéia - o lugar estava praticamente vazio - lembrando daqueles rascunhos que eu escrevia no meio da madrugada desejando aventura, viagens, emoções, um amor pra chamar de meu e autoestima pra conviver comigo mesma sem que isso fosse um fardo.

Quando a música acabou, milagrosamente eu pude chamar o Uber e só então começar a pensar que daria risada daquilo dali há algum tempo - 20 minutos depois pra ser mais exata, contei a história pra minha irmã numa chamada de vídeo e ela não parava de rir.

Aquele momento era uma conquista. Uma conquista esquisita e meio assustadora - no caso de você ter lembrado de todos os filmes de terror que tinham cenários como aquele, como eu fiz - mas eu nunca teria vivido esse momento singular se não tivesse dado o primeiro passo em direção aos mais monumentais perrengues que já passei na vida, mas também às coisas mais extraordinárias que eu outrora já nem ousava mais me imaginar vivendo.

O que me faz pensar que ás vezes os melhores momentos da nossa vida podem acontecer nas situações e nos lugares mais improváveis, com os detalhes mais inúteis, mas que só a gente sabe o quanto aquela sutileza - como uma música no rádio - nos marca. Ás vezes é uma pessoa, ás vezes a troca de olhares e toda aquela coisa romântica.

Mas ás vezes é só você, acompanhado da liberdade de viver seus próprios sonhos.