domingo, 28 de abril de 2013

Nostalgia


 Está tudo muito quieto. Alba só consegue escutar a respiração de Joseph ao lado, dormindo como uma pedra enquanto ela mergulha em seus devaneios no meio da madrugada. O silêncio a incomoda naquele momento. Ela deseja o agito, o som dos passos indo e vindo no meio da multidão. Quer música: muito jazz, blues e rock ecoando pelos auto-falantes do bar, enquanto todos conversam e tentam se encaixar numa sociedade em que ninguém os aceita como verdadeiramente são.
 Ela pensa em fugir pra um desses bares. Poderia fingir ser alguém que não é, ou alguém que costumava ser. Ainda é jovem, as pessoas dizem que ela tem um futuro pela frente. Pode escolher ser o que quiser e estar aonde quiser, com quem bem entender. No entanto, Joseph continua ao seu lado com a respiração lenta.
 "Talvez ele também queira fugir", pensa. "Talvez também queira ser outra pessoa, ter outra vida, só por uma noite. Por uma noite fugir da realidade ao som de Alabama Shakes, Ray Charles, The Strokes ou The Smiths, quem sabe?".
 Era besteira querer mais? Mais do que noites juntos com sessões de comédias românticas acompanhadas de miojo? Porque sentia que não era. Aquilo costumava ser perfeito e agora transformara-se em rotina. Alba tem pavor da rotina, especialmente se envolver Joseph.
 Tinha certeza absoluta de que o amava, mas haviam se acomodado um com o outro. Ela não aguentava este sentimento rotineiro. Precisava de algo novo, de uma descarga forte de adrenalina. Aquela vida de final de semana não era pra ela, afinal de contas, estava louca para enlouquecer, da mesma maneira que ela e Joseph faziam quando se conheceram.
 Eram dois estranhos dando risada da vida, dançando como se estivessem próximos do fim, bebendo tequila atrás de tequila, deitados na avenida no meio da madrugada, apreciando o céu coberto de nuvens e com poucas estrelas. Dois malucos vivendo como se estivessem à mercê de algum roteirista aclamado por seu forte senso de maluquice e paixão desenfreada por boa música.
 Agora eles eram só uma versão ruim de alguma comédia romântica francesa.
 Trabalho, faculdade, família. Não importava mais o "nós", agora viviam por outras pessoas, e não significava tanto quanto costumava significar. Alba lembrou porque nunca pensou em se casar, e se viu presa em um casamento disfarçado, perguntando-se: "Seria o amor forte o bastante para suportar isto?".
 Enquanto ela pensava, Joseph sonhava com o dia em que se conheceram, e sorria, surpreso, ao desejar aquelas primeiras noites de volta, ao desejar a antiga e maluca Alba e o insano Joseph, que por noites souberam o que era estar apaixonado.


Sem mais joguinhos, amor


Por que pensar que o que toda mulher quer é um cara bonito do seu lado?
 Ninguém nunca se dá ao trabalho de tentar entender que quando pedimos companheirismo, não estamos pedindo um cartão de crédito, um corpo sarado ou um rostinho bonito. Posso afirmar que um sorriso me encanta, mas não é isso que faz com que eu me apaixone. Quando digo que o mercado de homens está ruim, liquidando tudo o que há de mais ou menos por aí, não estou apenas usando uma metáfora somente por usar. É sério.
 Homem de verdade, daqueles que se importam em te fazer feliz e não apenas em satisfazer a si mesmo, são muito raros nos dias de hoje. Alguém, em algum lugar do mundo, deve ter espalhado o boato de que nós mulheres só precisamos de algumas palavrinhas bonitas e bem colocadas pra cairmos no conto do vigário. Pra quem acreditou no tal boato, se ferrou.
 Já perceberam que o número de mulheres solteiras e independentes está maior? Não é mal de tia, não. É que as mulheres inteligentes não estão se deixando levar pelo papinho manjado de certos "homens". De alguma forma, ficou muito natural sacar quando alguém está tentando nos enrolar. O papel das redes sociais e dos torpedos é justamente o de mascarar isso. Não estou dizendo que as operadoras de celular e o próprio Facebook estão em um complô contra todas as mulheres, a fim de fazer homens se darem bem - até porque isso seria babaquice. Mas é uma arma e tanto para esses nada promissores homens preguiçosos de nossa geração.
 Com toda essa escassez de bons homens, o que nos resta é aprender a lidar com os "meninos" que aparecem em nossa porta. Isso pode ser um grande problema. Eu, por exemplo, não consigo fingir que não estou percebendo toda a ladainha de um cara. Sou bocuda, odeio que tentem me fazer de idiota. Encaro isso como uma afronta à minha pessoa. Posso ter muitos defeitos, mas de maneira alguma consigo me imaginar entrando no jogo de um homem que não vale nada apenas pela satisfação de estarem "jogando" comigo. Aliás, que satisfação?!
 Muitas mulheres vêem satisfação nisso. Eu não. O que me satisfaz está muito além de rostos e corpos bonitos. Algumas pessoas se deixam escancarar pelo rótulo de "passatempo" e não se importam com isso. Eu me importo.
 Pois é, eu posso ser profunda. Ler tantos livros me fez desenvolver um senso de romantismo platônico, mas só porque algum idiota inventou de espalhar por aí que sentimentos não deviam ser mais levados tão a sério. Esse cara deve ter morrido sozinho, e agora está levando outros idiotas para o túmulo junto com ele.
 O que toda mulher precisa entender é que cada uma de nós tem seu valor. Não precisamos fingir acreditar na conversinha de um babaca só para nos sentirmos desejadas.
 Sempre haverá alguém melhor que assumirá o papel que um homem de verdade deve ter.

Traços escondidos


"A cultura neste país está morrendo", disse o senhor de 85 anos, com seu forte sotaque italiano, dono de uma galeria que pertencia ao pintor Henrique Manzo.
 Esta galeria está bem no coração de São Paulo, perto de minha casa, no bairro do Jaraguá. Passei em frente à este lugar várias vezes, sem nunca nem parar para prestar atenção no que diziam as palavras bem acima de sua porta de entrada. Eu não era a única.
 Hamlet - o senhor que mora ali - contava um pouco da história de São Paulo antes de toda esta onda industrial que a cidade passou a seguir desde a década de 50. Os quadros de Manzo preenchiam a história com belíssimas imagens de uma São Paulo livre do asfalto e do trânsito, coberta de verde e arte de meados do século XIX.
 Sentir esta sensação de viagem no tempo de forma tão real nunca foi tão interessante. E depois de toda aquela conversa, foi inevitável não refletir um pouco nas primeiras palavras daquele senhor: "A cultura neste país está morrendo".
 Nunca fui de ir à museus, e quando o fiz foi com a escola. Gosto de pensar que a exposição de "Corpos Pintados" na Oca do Ibirapuera que fui lá em meados de 2006, ou até mesmo o museu do Itaú numa exposição sobre moedas, tenham tirado todo o meu interesse por este tipo de coisa. Só que eu era uma criança e o conhecimento não era lá minha prioridade, como devia ser.
 Diante daquelas obras tão detalhadamente realistas de Henrique Manzo, me vi sendo conquistada pela arte de maneira inédita em minha vida.
 Minha teoria sobre a literatura e a arte segue uma linha básica de raciocínio: viagem no tempo e no espaço. Quando estamos diante do que não conhecemos, passamos a entender de forma muito clara que não precisamos nos conformar com apenas uma realidade e nem nos habituar a ela. Existe um mundo cheio de possibilidades, e consequentemente, de música, arte e belíssimas obras literárias bem diante de nossos olhos.
 O conhecimento é ilimitado justamente para que possamos construir o nosso. Penso que o pior erro que uma pessoa tende a cometer nestes tempos de músicas eletrônicas e redes sociais, é limitar sua visão de mundo, das pessoas, dos lugares e das belas artes. Opinião formada é para quem não desafia a si mesmo. A vida sem desafios, por sua vez, é uma vida vazia e sem graça. E convenhamos, de pessoas vazias e sem graça o mundo já está cheio.
 Vamos lembrar que ninguém quer ser apenas parte da multidão. É claro que uma poderosa minoria adoraria nos transformar em peças padrão, meros objetos que não pensam por si mesmo, mas em conjunto e de forma manipulada.
 A Galeria Narciza, aquela no Jaraguá que comentei logo no início do post, é uma prova de que as palavras daquele senhor estão a um passo de se tornarem realidade. Se deixarmos a história de nosso próprio país isolada e trancada por mera falta de interesse, quem dirá que algum dia nossa cidade já foi coberta de verde, já teve artistas talentosíssimos que não precisavam de computadores para fazer sua arte e já foi uma cidade coberta por riquezas naturais e culturais, cuja maior parte sequer existe mais hoje em dia?
 Ignorar nossa história é ignorar nossa própria identidade cultural. Estamos mesmo preparados para deixar o resto do mundo pensar que não passamos de um povo influenciável, cuja cultura pode ser transformada pelo primeiro gringo que aparecer?
 Bem, eu não estou.

sábado, 27 de abril de 2013

Citação


"O coração humano tem tesouros ocultos. No segredo mantido, no silêncio selado…Os pensamentos, as esperanças, os sonhos, os prazeres… Cujo charme se romperia se revelado."

Charlote Bronte

sábado, 13 de abril de 2013

Desencanar


 Eu odiei quando a gente terminou. Principalmente porque não houveram palavras de término. Por piores que elas possam ser, nos tiram as dúvidas tortuosas e dão um ponto final a tudo. Quando se trata de acabar algo assim, bem, eu sempre irei preferir palavras à atitudes.
 Atitudes que magoam são piores que frases. O que falamos nem sempre condiz com o que sentimos. Você deu as costas e se mandou. Legal, um idiota a menos na minha vida. Infelizmente demorou pra perceber. Algumas pessoas levam muito mais tempo, mas eu levei apenas algumas semanas. Semanas que pareceram meses. E foi ridículo.
 Toda aquela fossa romântica com coração partido já sumiu. Olho pra você, para as suas mensagens e não sinto mais nada. Eu nem sequer consigo imaginar nós dois juntos, como antes. As lembranças não fazem meu coração pular mais forte, eu não lembro de você quando ouço certas músicas e não quero te ligar quando sei que estamos mais próximos, geograficamente falando.
 Você diz que sente minha falta e eu respondo sem emoção, sem ligar. É a melhor sensação do mundo...Ser eu de novo, sabe?
 Me livrei finalmente da visão limitada que desenvolvi em meu período de apaixonadinha. Agora eu saio por aí conhecendo gente interessante, conversando sobre tudo, dando risada, sendo aquela mesma pessoa que você conheceu - e perdeu! Percebo o mundo e as pessoas em toda sua dimensão. Saio da rotina desesperadora do tédio e descubro novos mundos, novas formas de pensar.
 Me sobram palavras a serem ditas, histórias a serem contadas, sorrisos, beijos e abraços a serem distribuídos. E tudo porque percebi depois de todo esse tempo que seu sorriso não chegou a iluminar meu mundo, e que suas atitudes estão melhores agora enquanto passivas - irônico, pois sempre foram.
 Romanticamente, você fora do meu mundo me faz bem. Obrigada, e não volte. A não ser que queira dar um alô. Apertaremos as mãos e seguiremos em frente, pois em meu novo mundo não existe mais espaço para sua permanência à longo prazo.
 Cuide-se!

domingo, 7 de abril de 2013

Esquisitice, nosso poder de cada dia



 Já disseram uma vez que mulher é bicho estranho. A frase pegou tão bem que nós, as próprias, maravilhosas e estranhíssimas, começamos a refletir nossa própria estranheza. Longe de querer dar soluções ou respostas a respeito de nossos pitis momentâneos, é claro. Afinal, nos justificamos muito bem com a tpm.   Mas parando pra pensar um pouco mais nisso, algumas coisas parecem ficar mais claras.
 Parece que fomos programadas para conseguir fazer tudo ao mesmo tempo, do mesmo modo que nosso coração foi feito para cicatrizar mais rápido do que o dos homens. Na prática, a coisa demora mais. Se alguém parte nosso coração, passamos semanas nos martirizando sobre nossos possíveis erros e acertos. Infelizmente, algumas de nós adoram se culpar pelos fins dos relacionamentos - o que faz a ressaca de amor durar um pouco mais.
 Ainda sim, quando nos recuperamos fazemos isso quase por completo. A força do "Girl Power" sempre acaba aparecendo em algum momento entre os soluços na madrugada e os novos flertes que surgem com o passar dos dias.
 Temos esse poder maravilhoso de dar a volta por cima sem precisar de muito. Basta, na verdade, amor próprio. É clichê, mas também é fato consumado que quando estamos de bem com nós mesmas a vida tende a ser mais charmosa, interessante e excitante.
 Conhecer alguém que tem a coragem de nos tirar isso nos deixa mal, mas não é o fim do mundo. Essa dor toda vai nos empurrar pra frente, daí na próxima vez você vai parar pra pensar melhor quando aquele carinha novo demonstrar sinais de babaquice. Porque toda mulher, querendo ou não, algum dia torna-se perita em idiotas. Cabe a nós aceitar isso como um dom utilitário ou apenas aceitar os idiotas.
 O fato é que uma mulher, quando gosta de si mesma, vai desejar e correr atrás do que é melhor pra ela. Nada me irrita mais do que pessoas que se contentam com o pouco porque não acreditam merecer o melhor. O melhor emprego, o melhor namorado, os melhores amigos.
 Perdi as contas de quantas vezes fui chamada de esnobe por pensar dessa maneira. E olha que nem sou do tipo que anda por aí com o nariz arrebitado, me sentindo melhor do que todo mundo. Veja bem, não é ser melhor que os outros, é acreditar ser merecedora das coisas ótimas.
 Se é pra acordar todos os dias, enfrentar os demônios diários que lutam para acabar com nossa paz e arriscar sair de nossa zona de conforto, poxa! Nada mais justo eu não me contentar com qualquer coisa.
 Sou adepta à objetividade e, principalmente, à simplicidade. O que proponho aqui não é um exercício de narcisismo, mas sim uma transformação na maneira como pensamos e enxergamos nós mesmas. Dizem que somos bichos esquisitos não só porque sangramos todo mês, como diria Rita Lee.
 Nossa esquisitice vem da arte de ser mulher: de passar por cima dos preconceitos, de surpreender, de fazer várias coisas ao mesmo tempo, de poder cicatrizar as feridas de nossos corações, de acreditar em nosso "Girl Power" e ser capaz de fazer os outros acreditarem nele também. E é por isso mesmo que essa historinha de "sexo frágil" nunca vai colar com a gente.
 Mulher poderosa não é frágil, é simplesmente...Poderosa.