domingo, 6 de dezembro de 2015

Sobre deixar de ser a regra


 Não sei muito de relacionamentos longos, admito. Por isso mesmo sempre fico meio sem jeito quando estou numa roda em que a conversa predominante tem a ver com a rotina de um casal ou seus planos para o futuro - especialmente quando eu sou a única solteira na roda.
 Mas o que me falta de experiências me sobra de imaginação. Pois bem, ficamos aí sendo julgados por idealizarmos o tipo de relacionamento que gostaríamos de ter. Mas se não vamos fazer isso, quem fará por nós?
 Antigamente, minha visão sobre isso envolvia a minha total independência em um relacionamento aberto. Me sentia descolada, mas estava apenas optando pelo caminho mais fácil, onde você não precisa se comprometer com o cara, nem com os amigos do cara e menos ainda com a família do cara.
 Se acabar, ufa. Um alívio! Bola pra frente porque, mais uma vez, cá estamos nós sendo a regra ao invés da exceção.
 Só que isso dói, cara.
 Mas deixemos as dores pra lá.
 Fato é que há tipos de casal - e apesar de não estar apta por experiência a analisar um desses tipos, arrisco-me mesmo assim. Resumidamente, posso separá-los em dois grupos: os que tem planos e os que não tem.
 Casais que não tem planos deixam a vida levá-los. Vivem de acordo com o nível de suas paixões e são movidos repetidamente por essas emoções tão volúveis que as pessoas tem.
 Legal. Parece emocionante essa vida sem regras, livre de amarras e satisfações. Será?
 Não aparenta ser muito fácil.
 Já parou pra pensar no que é a vida sem propósitos? Ela é vazia, basicamente.
 Estar em um relacionamento sem propósitos é desgastante emocionalmente. Sabe, quando as pessoas passam em sua vida, elas tendem a deixar marcas. Só que chega uma hora em que nos cansamos de ficar colecionando cicatrizes. Dá vontade de ser marcado por algo bom, pra variar.
 Acredito que, mais do que o contato físico e emocional, estar com alguém envolve ter e depositar esperança no futuro.
 Me chame de sonhadora, mas tenho tido esperança.
 E uma das coisas boas disso é que você para de ficar aceitando as migalhas dos outros e passa a se sentir merecedor de um futuro que tem tudo para ser incrível.
 Você finalmente para de acreditar que será sempre a regra, a outra, a segunda opção - ou a quinta, sei lá.
 Por isso, você pode até me chamar de iludida ou pensar que eu estou vivendo no " Fantástico mundo de Bob", mas não posso me permitir NÃO idealizar, sabe?
 Vou acreditar que um dia poderei admirar o caráter de alguém que se sente a vontade sendo ele mesmo. Alguém com bons princípios, firmados e fortalecidos, um coração de ouro e, se possível, bom humor pra levar o dia a dia e seriedade pra lidar com o que for necessário. E tudo isso sem desconfiar de que aquilo é tudo fingimento.
 Sabe o outro tipo de casal que eu estava pra mencionar? Bom, eles têm planos. E pra ser bem honesta, eu sempre achei isso muito admirável.
 A gente só faz planos realmente significativos com quem pretendemos compartilhar nossas vidas. E pra compartilhar, temos que entrar em um processo de aprendizagem que também envolve abrir mão de muita coisa em prol da boa convivência. Complemente isso com amor e você me verá repetir: Isso é admirável pra caramba!
 Vejo agora como uma mentira essa admiração que muita gente tem por pessoas que tem "coragem" de se entregar a algo que está fadado ao fracasso. Fácil se entregar sem calcular os riscos.
  Difícil mesmo é, depois de tanto cálculo, a gente acabar percebendo que por amor vale a pena abrir mão de tanta promessa vazia de felicidade e prazer pra viver algo muito mais profundo.




quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Histórias de paixão


Gostaria de lhe contar sobre o que é estar apaixonada, mas não tenho boas histórias de amor. Tenho histórias de riscos que foram corridos, mas em prol do amor? Não sei, não.
Isso que gostamos de chamar de amor e que nos faz sentir uma palpitação fora do normal dentro do peito não é amor, é paixão. Com o tempo, isso pode vir a ser amor, mas até que esteja plenamente edificado, nossos corações, quando apenas dominados pelo fogo da paixão, tendem a ser frágeis e vulneráveis.
Como eu dizia, não tenho boas histórias de amor. Mas tenho um montão de palavras que foram ditas e logo perdidas em um passado nebuloso. Ah, eu tenho palavras lindas, ditas de "todo coração". Tenho canções cantadas ao pé do ouvido, letras enviadas por mensagem e melodias carregadas de emoção.
O que eu tenho são momentos.
A grande canalhice dos momentos é que eles são efêmeros. Uma vez me disseram que eu devia aproveitá-los mais, esquecer do passado e do futuro. O presente estava bem ali na minha frente esperando ser vivido. Daí completaram, disseram que isso poderia até virar amor.
Mas vou te dizer uma coisa, não se conhece de verdade uma pessoa quando estamos no calor da paixão. O que a gente conhece é uma imagem construída em nossa mente para sustentar nossas fantasias românticas de juventude.
Porém, não vou pregar que a paixão é uma cilada. Na verdade, é bem interessante. Acredito que sentimos quando algo vale a pena ser vivido, pois aí nem sequer deixamos que as dúvidas tomem conta de nossos pensamentos.
Outras vezes, sentimos aquele desconforto dentro de nós, como se algo estivesse a nos alertar que estamos prestes a cair numa armadilha. Gostaria de dizer que em todas as vezes que senti isso eu segui minha intuição à risca, mas isso seria uma mentira.
Por outro lado, nunca consegui me enganar por tanto tempo. Quando você fala muito consigo mesma, tende a ouvir um montão de sermões também, e todos eles vindos das análises minuciosas feitas por sua mente a cada momento em que as peças de um grande e bagunçado quebra-cabeças são encaixadas.
No final, restam algumas verdades. Elas podem facilmente causar tristeza, raiva, indignação, alívio ou alegria - não necessariamente nesta ordem.
Mas tudo bem. Faz parte da construção da tão almejada inteligência emocional. Ao menos sobram experiências para ótimas histórias. Histórias de paixão nunca saem de moda, mesmo.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Construção de identidade


Veja bem, eu tenho lido bastante. Sobre pessoas, para ser mais específica. Tenho feito isso para tentar entender seus comportamentos e, no início, acreditava firmemente que o fazia para tentar me ajustar a eles. Eu dizia a mim mesma: Não é uma questão de insegurança, é adaptação.
Bobagem.
Mas devo dizer o que descobri: pessoas são realmente interessantes. Sabe, se parássemos de passar 95% do tempo pensando em nós mesmos, conseguiríamos perceber tudo o que pode haver de mais gentil, amoroso, perturbador ou curioso nos outros.
Então, cá estou para dizer o que descobri recentemente. Usarei minha própria história para relatar estas descobertas.
Para começar, devo dizer que quando criança e adolescente, eu gostava muito de teoria. Achava que era fascinante. Pensando bem, acredito agora que eu estava apenas convencida de que era uma maneira mais fácil de passar pela vida sem ter que ser afetada por todas as instabilidades que nos expõe.
Por isso eu nunca colocava nada do que aprendia em prática. Sabe, quando você cresce dentro de um sistema educacional que luta pra te convencer de que a escola está ali apenas para que você passe no vestibular e nada mais, tende-se a pensar justamente desta forma.
Mas eu cresci, me formei no ensino médio e logo entrei na faculdade.
Meus primeiros meses na faculdade foram de um fascínio impressionante. Lá estava eu tentando entender a razão - ou loucura - dos filósofos, e sendo bombardeada de descobertas sobre o comportamento humano e a forma como ele influenciava nas esferas política, religiosa, familiar, etc.
Apesar de tudo isso, eu não me sentia merecedora de estar ali. De fato, eu passei alguns meses pensando seriamente que deveria dar ouvidos aos meus medos e dar o fora o mais rápido possível. Fui totalmente convencida pelas minhas inseguranças de que não pertenceria àquele lugar nem em mil anos, e então desisti.
Isso aconteceu há uns 4 anos, mas na época, demorou apenas 6 meses para que eu percebesse que também não pertencia ao lugar de passividade em que me encontrava: deixando a vida me levar.
Entrei na faculdade de novo e me deixei ser conquistada pelo conhecimento que ela tinha a me oferecer, e não apenas porque eu queria um bom emprego, mas porque eu queria ir além e "curiar" tudo o que podia.
Minha área é a Comunicação, o que é bem irônico considerando que eu posso ser a pessoa mais calada do mundo quando largada num canto em qualquer lugar onde há pessoas demais. Por conta disso, minha sensação de pertencimento ainda continuava em baixa.
Mas diferente de minha primeira tentativa acadêmica, eu insisti e comecei a lutar contra os meus receios. Em algum momento, coloquei na minha cabeça que não faria nada menos do que o melhor - se não, eu preferia não fazer.
Então, assistindo a uma palestra de Amy Cuddy sobre linguagem corporal, comecei a observar meus hábitos. A maneira como nos portamos define quem nós somos, e a verdade é que se começamos a fingir que somos algo, podemos fazê-lo até realmente nos tornarmos isso.
A palavra "fingir" pode soar até forte e, em um primeiro momento, remeter a algo negativo e falso, mas vamos nos aprofundar mais nisso. Pensemos que, para que algo se torne um hábito, temos que fazê-lo todos os dias durante mais ou menos uns seis meses. E então, a coisa em si será tão natural que passará a fazer parte de sua personalidade.
Já ouvi diversas frases sobre coragem, mas a que mais me chamou a atenção por sua honestidade foi a de Franklin P. Jones. Ele disse: "Coragem é ser o único que sabe que você está com medo".
Sei que é uma forma de dizer que a coragem pode ser uma máscara, mas vamos admitir que é louvável e válido, considerando que ela é necessária para sobrevivência em qualquer tipo de sociedade.
Então, como um teste, comecei a fingir algumas emoções. E dentre elas, a mais válida foi a confiança que eu transparecia em mim mesma, da minha voz até minha expressão corporal. Cara, eu até cortei o cabelo! O fato de ficar sorrindo e tentando convencer a mim mesma de que eu sou boa em me comunicar talvez tenha sido a parte mais difícil. Mas funcionou.
Aqui estou eu, em um momento de minha vida em que me sinto plenamente confiante e menos insegura do que costumava ser. Parei de deixar que o medo roubasse a minha identidade, e comecei a colocar em prática as coisas que são relevantes para uma mudança de vida.
Descobri quem eu sou. E isso soa deveras piegas, eu sei. Mas é interessante o fato de que a cada dia descubro mais sobre minha personalidade, e ainda mais importante, sobre as pessoas ao meu redor.
Em outra palestra que assisti, desta vez sobre o poder da vulnerabilidade, a professora Brené Brown disse algo muito interessante sobre algumas das características das pessoas confiantes. Veja o que ela disse:

"(...) elas estavam dispostas a deixar de ser quem elas pensavam que deveriam ser a fim de ser quem elas eram".

Sabe, tem muito a ver com sairmos deste estado de passividade tão tentador que só tende a nos tornar deprimidos e inseguros. É sobre construirmos quem somos com base nas escolhas que fazemos.
Refletindo sobre minha própria história, eu tinha tudo para permanecer no estado em que me encontrava, acreditando que não merecia ser diferente, não merecia uma vida extraordinária e não merecia meus sonhos. Eu poderia continuar rendida ao meu honesto estado de depressão, insegurança e tristeza.
Mas o poder tem a ver com a nossa reação ao estresse. No final das contas, talvez não estivesse fingindo ao sorrir e acreditar que eu era boa em alguma coisa. Talvez estivesse apenas recuperando a confiança que havia sido tirada de mim durante tanto tempo.
Claro que ainda há coisas a serem trabalhadas em minha personalidade e na maneira como reajo às situações, mas fico feliz em saber que desta vez estou mais disposta do que nunca.
É preciso disposição para ter uma vida extraordinária. Mas a definição do que é extraordinário pra você fica a seu critério. Escolha com sabedoria.



terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Like a fool



Sabe, não importa quantas experiências eu tenha com relacionamentos, eu continuo como uma principiante. Minha consciência me diz que tenho medo de me entregar e que fico inventando motivos para fugir do imaginário romântico que é estar com alguém.
Quero sempre convencer a mim mesma de que há coisas mais importantes a se fazer. Há pessoas pra conhecer, coisas a estudar e lugares para descobrir.
As paixonites tendem a me limitar.
Imagino que seria muito mais fácil ser como os outros, que criam uma vida baseada no sentir. Já diziam por aí que a ignorância pode ser uma benção.
Mas cá estou eu, na frente desta tela iluminada, no meio de meu quarto escurecido, ansiando para que as palavras saiam da forma mais natural e honesta possível. Este som das teclas é como música para os meus ouvidos... É como ouvir Frank Sinatra em um dia de chuva.
E mesmo assim o coração aperta. Quer trabalhar sozinho, pedir as contas. Diz que cansou de trabalhar com minha razão... Diz que ela me põe amarras, que eu não sei o que é aproveitar a vida. Meu coração poderia me ensinar, poderia cuidar de tudo. Ele me mostraria este mundo cheio de coisas tentadoras e emocionantes. Cheio de momentos.
Viva o momento! Sinta o momento! - ele diria.
"Seja escrava dos momentos" - eu ouviria - "Não construa nada pra si, algum dia tudo acabará".
Honestamente, eu não acredito nesses discursos em que o coração deve mandar. O coração pode ser mimado e desenfreado em sua incessante busca pela parte que lhe falta.
Mas eis uma verdade: eu sei o que me faltava, e esta parte aqui dentro está perfeitamente preenchida, obrigada.
O aperto que sinto agora é incômodo, admito, porém passageiro. Em algum momento eu acordarei e me sentirei livre das lembranças e do passado. E por aquilo que eu só posso encarar como um milagre, a esperança que tenho é muito maior do que as memórias de um romance que não passava de um turbilhão de palavras bonitas e mascaradas.
Ninguém estava fingindo, eu sei. Mas vamos admitir, somos muito bons em nos enganar.


domingo, 23 de agosto de 2015

Padrões



 Estou já há alguns meses sem ter um encontro. Ou melhor dizendo, um bom encontro.
 Eu, particularmente, detesto sair com pessoas totalmente diferentes de mim. Não porque eu me acho superior, mas simplesmente porque neste tipo de situação, eu sempre acabo tentando me enquadrar um pouco na personalidade do cara. É como se eu ficasse buscando uma brecha pra convencer que temos sim algo em comum - algo além do mesmo amigo.
 Nunca dá certo.
 Dependendo da minha força de vontade, o tiro sempre acaba saindo pela culatra, mais cedo ou mais tarde. É quando eu já nem tento mais e fico tomando goles da minha bebida e olhando para a tv fingindo estar prestando atenção no noticiário pra tentar ignorar que aquilo está péssimo.
 Daí fiquei me perguntando porque é que nós, mulheres, estamos sempre tentando ser a mulher perfeita pro tal cara que vai mudar em prol de nossa vã perfeição?
 Lá nos anos 60, a emblemática mulher perfeita era a dona de casa requintada, bem arrumada e conformada. Quando navego em alguns posts do Facebook, o que mais vejo são novos padrões. Sempre encontro um ou outro texto pseudointelectual que afirma ser o manual para relacionamentos. Em um deles, havia uma lista das qualidades que toda mulher do século 21 devia ter pra conseguir um cara legal.
 E lá estava eu lendo que a mulher tinha que falar de futebol e gostar de UFC. Se eu fosse levar a sério aquele ridículo texto, eu estaria totalmente convencida de que estava ferrada. Primeiro porque, por mais que eu tente, não consigo entender lhufas de futebol, e nem tenho paciência pra ouvir a explicação sobre o porque alguns gols são impedidos.
 Além do mais, UFC pra mim é moda. E não, não dá pra entender porque é que tanta gente gosta de ver o povo levar porrada de graça. São assuntos totalmente fora de pauta pra mim.
 E não é que eu condene todos que gostam de UFC ou futebol. Simplesmente são coisas que não se encaixam em meus gostos pessoais e, honestamente, não estou disposta a fazer nenhum esforço para gostar.
 Mas o tempo todo eu vejo garotas falando com total empolgação dos tais assuntos quando estão numa roda de amigos. Elas carregam cervejas em long neck, vestem uma roupa apertada, enchem a cara de reboco e saem por aí fingindo ser a garota descolada que também curte coisas de homem.
 Existem sim mulheres que gostam mesmo destas coisas, mas não é delas que estou falando. Você, caro leitor, sabe bem a quem me refiro.
 O que vejo são novos padrões engolindo antigos padrões, mas que no fundo, remetem à mesma ladainha de sempre: a mulher tem que ser "a" mulher.
 Todo esse papo de mulheres que tentam ser o ideal dos homens me fez lembrar do livro "Gone girl" - vulgo "Garota Exemplar", de Gillian Flynn. O que vemos é uma mulher que desde o início mostrou-se totalmente perfeita ao cara pelo qual se apaixonou, e logo depois que mostrou quem era, seu casamento entrou em crise.
 Não que o extremo de personalidade que o livro propõe seja a realidade de todas as mulheres, mas faz todo sentido.
 A verdade é que, no fundo, todas nós gostamos da ideia de estar solteira por um tempo. O problema é que, por todos os lados, estamos sendo pressionadas a termos um relacionamento estável. E a pior parte é que, quando todos os nossos amigos já estão em um, sempre tem alguém tentando nos ensinar como é que a coisa toda funciona.
 Será possível que eu, em meu livre-arbítrio não poderia simplesmente viver a vida da maneira que eu quiser? Há uma real possibilidade de eu lembrar como é bom estar, de fato, solteira, ou preciso mesmo de mais um relacionamento ruim pra lembrar disso?
 A ideia de viver sozinha o resto da minha vida não me atrai de maneira nenhuma. Solidão é um porre. Mas há outras ideias além de estar em um relacionamento, certo? Posso eu sonhar em ser bem sucedida sem ter que traçar planos para casar daqui há 5 anos?
 Claro que sim!
 Encontrar a pessoa certa leva tempo. E depois de um tempo passando por tanto relacionamento errado, concluí que toda essa tal "experiência" não vale de nada. Quando se trata de pessoas, quantidade não é tão importante quanto qualidade. É importante perguntar a si mesmo o quanto você amadureceu ou emburreceu naquele último relacionamento. Se acrescentou, bem, se não, de que adianta continuar tentando os mesmos métodos com os próximos?
 Vou te dizer o lado bom de não ficar fingindo ser outra pessoa para impressionar outras: você é único! Pode ser que hajam pessoas parecidas com você, mas só você é você. Então pra quê ficar perdendo tempo construindo uma nova personalidade, se no final das contas a sua máscara vai cair e você vai sentir falta de ser você mesmo?

quinta-feira, 30 de abril de 2015

Correr



 Tem gente que gosta de comparar a vida com um montão de coisas. Pra fazer uso do meu direito inerente de comparação, eu tenho que dizer que gosto de comparar a vida com a corrida.
 Mas não tem a ver com ganhar nem nada. Neste caso, não falo da corrida como um esporte competitivo. Me refiro muito mais à sensações e momentos que, na minha opinião, tem tudo a ver com essa modalidade.
 Quem me conhece sabe que, recentemente, eu me tornei uma adepta chata da corrida - daquelas que se orgulham dos quilômetros percorridos e dos quilos perdidos. Mas os primeiros dois meses são terríveis, especialmente se o único motivo que nos leva a correr é o fato de estarmos acima do peso. Mas o tempo foi passando, e depois de ter a oportunidade de usufruir de momentos de reflexões intensas nessas corridas de praia que todo artista diz que adooora, acabei criando gosto pela coisa.
 Gosto de comparar a vida com uma corrida porque, pra começar, o início de algo que tende a se tornar grande - ou uma paixão - é sempre meio difícil, exige uma atitude que nos faz pensar sobre o que queremos, traçar metas e finalmente perceber que não vai dar pra chegar lá sem tirar a bunda do sofá.
 Daí vem a fase de adaptação, que, devo dizer, é simplesmente terrível. Tende a ser bem tediosa. É aonde começam a surgir palavras como comprometimento e disciplina. Você vai trocando um hábito nada saudável por um esforço que te obriga a abrir mão das tardes assistindo séries e dos lanches no comecinho da noite - sempre regados de deliciosos pães assados, queijo, bolos e doces.
 Todo e qualquer esforço nessa fase é válido, mas sempre tem um aspecto de grande sacrifício. Muitas vezes, dá uma vontade danada de desistir. E eu não sei vocês, mas sempre acabo buscando desculpas lógicas pra desistir de um estilo de vida alternativo.
 Superado o trauma, a gente começa a perceber os resultados e a considerar válida a possibilidade de que existe uma pequena chance de dar certo e, sei lá, sermos bons naquilo - ou muito bons, vai saber. Então, dá vontade de ir além, pesquisar mais, treinar mais, suar a camisa pra valer.
 Nos empolgamos tanto que queremos dar passos maiores do que nossas pernas. A gente não quer correr, quer "voar". Claro que não há nada de errado em pensar grande e ir além das possibilidades, mas acabamos sendo cegados por um certo deslumbre e, o fato de estarmos tão sedentos pela chance de ultrapassar nossos limites mais prejudica do que beneficia.
 Daí vem as lesões.
 Semana passada senti a tal lesão. Por algum motivo, eu achei que já era boa o bastante pra correr em uma velocidade maior do que meu corpo estava acostumado. Uma atitude até louvável - quer dizer, olha eu saindo da minha zona de conforto! Mas repito: passos maiores do que as pernas normalmente nos fazem tropeçar.
 É quando a gente precisa encontrar o equilíbrio. Ou melhor: é quando a vida te obriga a encontrar um equilíbrio. Significa que tá na hora de tratar a ferida - ou lesão, sei lá, estou sendo metafórica aqui - deixar pra trás certos hábitos errôneos e se concentrar no presente, e no futuro também, por que não?
 Volta a disciplina tentando nos fazer aprender que temos que seguir nosso próprio ritmo e adotar maneiras mais benéficas de lidar com os problemas, ao invés de continuar insistindo na mesma fórmula fracassada que só nos atrasa.
 Depois de passar por todas essas fases, a gente acaba percebendo a maravilha da corrida: Liberdade pra lidar com o próprio corpo e superar os próprios limites. E finalmente dar-se conta de que enquanto parece que estamos correndo pra lugar nenhum, nós estamos sim tentando chegar à algum lugar, seja ele um estado de espírito ou um paraíso particular de fuga do estresse do dia a dia. E este tentar - o meio da jornada - é o que mais vale a pena.
 Por isso, encaremos a vida, não como uma competição acirrada para chegar sempre em primeiro lugar, mas como uma corrida que começa devagar, tem seus picos de empolgação e também uns momentos extremamente cansativos. Mas ela nunca perde sua natureza intrínseca: uma prazerosa liberdade de poder superar a si mesmo.

quarta-feira, 22 de abril de 2015

Deixa ESSE passado entrar



Tinha um cara naquele filme bacana do Woody Allen com um papo de que pessoas nostálgicas têm tendência a negar a realidade. Um babaca, é claro. Acho que o personagem principal agiu da mesma maneira que eu provavelmente agiria - afinal, ele era o alvo da crítica. Um girar de olhos disfarçado e um sorriso de educação que escondia um singelo: "Por gentileza, cale a boca".
Admito que não sou a pessoa mais adequada para julgar esse tipo de constatação, afinal eu ainda me sinto hipnotizada por certos aspectos artísticos do passado cujo intuito eram justamente o de serem eternizados. Mas diga-se de passagem, o personagem do tal cara com a observação tendenciosa não passava de um pseudointelectual.
Acredito firmemente que a questão não gira em torno de estarmos ou não negando a realidade. Até porque isto é deveras inútil. Todos os dias somos obrigados a encará-la. Não me lembro de um dia sequer em que decidi fingir ser a rainha da Inglaterra só pra sair da rotina.
Isto é uma questão de prazer cultural.
Não há argumento que me convença de que estamos vivendo a melhor das eras no campo da música, da arte e da literatura. Na verdade, essa é a era do "nada se inventa, tudo se copia".
E de fato estamos até mesmo um pouco entediados com toda essa monotonia frenética do dia a dia das grandes metrópoles. São simplesmente os mesmos filmes com temas de super-heróis, as mesmas exposições com "artes" que até a minha sobrinha de 2 anos conseguiria fazer, bares descolados com muita gente... Muita gente a fim de conversar com mais gente, só que pelo Whatsapp.
Vez ou outra encontramos algo divertido, que tira risadas genuínas, tornam-se momentos memoráveis, despertam a nossa curiosidade e aguçam nosso desejo de buscar o que é novo.
Eu, particularmente, sempre acabo me vendo nesse tipo de ocasião quando estou de alguma forma ligada com algo do passado.
Claro que, no caso, deixo de lado as lembranças que envolvem ex-namorados - até porque a ideia aqui não é a de ficar na fossa.
Estou falando do genial Frank Sinatra, do talentoso Ray Charles e dos harmoniosos The Temptations. Falo de letras marcantes. Falo de Aretha Franklin encontrando seu grande amor em "Natural Woman" e de Billie Holiday comprometendo-se a amar em "Come Rain or Come Shine".
E como não sonhar em estar apaixonado se parecia simplesmente tão incrível naquelas canções dos Beatles?
E eu poderia ficar a noite inteira descrevendo as músicas, os filmes (só eu adoro aquele drama exagerado de "The Breakfast Club?", os livros (ainda devoro as palavras de Jane Austen sem me cansar) e ainda sim eles continuariam fazendo total sentido, mesmo sendo os responsáveis por esta minha eterna ilusão - ou esperança - de que sempre haverá algo além do superficial, que tem a capacidade de nos tocar, marcar nossas vidas e moldar nossos pensamentos.
 Acho que é por isso que gosto tanto do filme "Meia-noite em Paris": um cara vivendo seu sonho de viver todas as noites ao lado de seus escritores, músicos e artistas preferidos. Tendo a oportunidade de maravilhar-se num mundo que não deixa de encantá-lo.
 Quem não gostaria?

sexta-feira, 3 de abril de 2015

Em defesa dos introvertidos


Quando era adolescente, não achava essa coisa de ser tímido tão fascinante. Na verdade, nunca foi fascinante pra mim. A palavra "introvertido" sempre me remeteu à algo negativo. Pra mim era um grande mistério tentar entender qual era o real motivo de alguém achar nisso algo positivo. Com certeza foi um teste de paciência e, eu diria até de amabilidade, mas acho que isso é ir longe demais.
 De fato, meu problema com a timidez diminuiu com o passar do tempo, mas a tal da introversão continuou. E como poderia ir embora? Timidez é medo da rejeição, introversão é personalidade.
 Se soubesse disso naquela época, talvez entrasse em estado de desespero. E como não? Quando se tem 15 anos, ser extrovertido é a melhor coisa que pode acontecer. Ninguém fica achando que você tem "sérios problemas em se relacionar" ou fica sugerindo que você saia mais, namore mais e pare de ir à biblioteca quando o objetivo é cabular aula - uma estranha característica minha nos tempos de escola.
 Por outro lado, ser introvertido numa fase em que tudo o que você quer e sente que precisa fazer é se definir, bem, dificulta as coisas.
 Demorou um tempão pra que eu parasse de ficar "tentando me encontrar". A gente tem essa mania de tentar ser um pouco de tudo só pra se encaixar e acaba se frustrando quando percebe que nenhuma daquelas personalidades nos pertencem.
 Só que o tempo passa e hora ou outra a vida nos coloca na posição de se aceitar ou continuar inventando personalidades. Se chegar nessa fase, eu sugiro que seja você mesmo.
 Sei que a mensagem é deveras piegas, mas é bem realista. Viver de aparência é extremamente cansativo.
 Depois de um bom tempo partindo da premissa de que inventar personalidades era bem mais interessante, o cansaço das aparências finalmente me dominou e eu me vi numa crise de identidade - quem nunca?
 Fico feliz por Susan Cain ter escrito o sensacional "O poder dos quietos". Foi a primeira vez que me senti tão absolutamente sortuda por ser introvertida. Há algo de muito charmoso e interessante em estar desgarrada dessa ideia dominante de que ser extrovertido é o que há!
 Introvertidos são interessantes. Abominamos conversas fiadas, mas adoramos nos aprofundar nos mais variados assuntos. Podemos não ser os mais falantes em uma conversa, mas essa aptidão de ouvir mais nos ajuda a compreender o outro de maneira mais abrangente, solidária. Nos ensina a observar aspectos mais profundos do que é dito, como é dito e porque é dito.
 A ideia de que somos sozinhos e de que gostamos disso é totalmente distorcida e distante da realidade. Temos anseio em conhecer pessoas, mas buscamos relacionamentos mais profundos e resistentes. Não temos muita paciência para o que é superficial, por isso gostamos de mergulhar naquilo que é intelectualmente e emocionalmente relevante. Por isso é que conto os amigos verdadeiros nos dedos e ainda sim me sobra espaço.
 Quero deixar claro que não estou pregando contra os extrovertidos. Na verdade, eu adoro pessoas extrovertidas. Elas nos desafiam, nos intrigam, nos encantam, nos complementam. Alguns sortudos podem até ter o que a Susan chamou de "o melhor dos dois mundos" - algo entre o introvertido e o extrovertido.
 Só estou tentando fazer com que entendam que há mais na introversão do que se pode imaginar. Eu costumo sorrir feito boba quando percebo que estou começando a desvendar alguém, e com o passar do tempo vejo que ainda há muito a ser descoberto.
 Por isso, numa época em que o Facebook tem definido as pessoas, eu acredito que podemos e devemos ir além e ampliar o nosso olhar para aqueles que não conseguimos entender, mas que ainda têm a muito a nos mostrar.