Eu odeio atrasos.
Na verdade, se houvesse alguma escala que determinasse o nível de ódio que alguém pode ter com relação à atrasos, eu estaria no nível máximo.
Um dia desses marquei um encontro com um ex-peguete que não via há um tempo. Eu estava daquele jeito que só uma menininha apaixonadinha fica quando vai rever o objeto de sua atenção - uma tremenda idiota.
No caminho até o ponto marcado eu já estava fazendo desabafos sobre meu estado de espírito antes do tal encontro, por estar nervosa e tal. Esperava mesmo que minha consciência me desse sábios conselhos que incluíam um final feliz para aquele encontro, mas ela estava bem negativa. Aparentemente eu havia esquecido todos os motivos que me fizeram xingar o tal sujeito por meses.
Pfff... Besteira!, pensei.
Então lá estava eu, chegando ao tal lugar e logo depois sendo avisada que aconteceu um imprevisto e ele chegaria um pouco atrasado. Pois bem, sensata como sou, respirei fundo, soltei mentalmente um singelo "Tá de sacanagem?" e logo depois deixei pra lá, afinal, imprevistos acontecem, certo?
O grande problema em ter que tolerar um "pequeno" atraso bem ali no ponto em que escolhemos para nos encontrar era que, bem... Aquele lugar era um tanto perigoso, por assim dizer. Relevei. Estúpida e com esperanças imbecis do jeito que estava, não me parecia um grande sacrifício esperar uns vinte ou trinta minutinhos a mais.
Só que os minutos foram passando e a lei de Murphy, sempre fiel em seu apego para comigo, fez questão de dar as caras só pra me lembrar que as coisas sempre podem piorar. Pra começar, havia um cara embriagado de calças abaixadas que havia acabado de ser expulso da estação por tentar se "esfregar nas mulheres", palavras do guardinha. Ele deve ter ficado um bom tempo ali parado, sem falar coisa com coisa e soltando perguntas como: "Né, menina?". Olhando em volta, infelizmente a única menina ali era eu. Resolvi entrar na estação. O acúmulo de pessoas ali me parecia um pouco mais seguro do que ficar dando bandeira na rua com o maluco das calças abaixadas.
Enquanto lia o "Guia do Mochileiro das Galáxias" - que amenizava o nervosismo e a raiva de estar esperando há meia hora o tal sujeito que nunca chegava - bateu uma onda de frio. Sem problemas, exceto que eu estava com as pernocas de fora, com um shorts. Sabe como é, quando saí de casa o sol ainda brilhava e deixava o tempo com uma brisa gostosa de se sentir. Então me pareceu uma boa ideia mostrar as pernas. Erro número dois.
O livro já estava perdendo o sentido quando se passaram 45 minutos de espera. A paciência que eu nem sabia que existia - deve ser a merda da paixão - estava aos poucos indo embora. À essa altura já estava tudo escuro, meus nervos estavam à flor da pele e eu me esforçava para não soltar em voz alta todos os palavrões que insistiam em passar pela minha cabeça. Não seria delicado da minha parte.
Reparei que eu teria que beber um pouco além da conta para mudar meu mau-humor e não estragar tudo, se é que ainda haveria algo para ser estragado. Quero dizer, a coisa toda já estava toda cagada, mesmo. Eu era uma solitária dentro de uma estação descoberta, vestindo shorts enquanto o vento gelado batia em minhas pernas, rindo sozinha dos diálogos engraçados de Douglas Adam enquanto tentava equilibrar meu humor na tênue linha entre a minha paciência - já enfraquecida - e a raiva.
Quando reparei que já fazia uma hora que estava ali, passei a me perguntar se minha consciência não estava certa e tudo aquilo não fosse uma tremenda besteira. Há uma hora eu estava ansiosa para um encontro com o cara que nunca fez questão de me ligar, ou de me visitar. Que nem consegue abrir a boca pra me soltar um elogio, mas tem tiradas "ótimas" quando se trata de zoar da minha cara. O mesmo cara que revelou certa vez que eu era "mediana", mas tudo bem, porque ele curtia medianas. E então, de repente...PORRA!
É, eu explodi. Não literalmente, é claro. Isso seria doloroso. Saí dali irritada, queimando metaforicamente tudo aquilo que me fez passar tanto tempo achando que seria o máximo. Mandei uma mensagem educada, mas firme:
"Estou indo embora". Recebi uma desculpa de "
Estou no trânsito" e nem me toquei de perguntar aonde, porque daí quem sabe eu poderia esperar dependendo da distância. Mas a raiva tomava conta e tudo o que disse foi:
"Entendo. Só não vou mais ficar aqui. Espero que entenda também". Boom!
Fui juntando pontos quase de forma obsessiva, como Jim Carrey em "Número 23".
Ele estava atrasado porque imprevistos acontecem. Bacana. Compreensível. Mas a verdade era: se ele queria aquilo tanto quanto eu, poxa, não teria um esforcinho extra? Quer dizer, sério que eu nem sequer valia uma arriscada básica para fazer o caminho da minha casa que nem era tão difícil assim e já havia sido feito várias vezes?
A resposta, meus caros, era:
"Tá, se você quer assim...".
Ou seja, um gostoso: "
Ah, foda-se. Azar o seu".
E tudo o que eu consegui pensar naquela hora foi a vaga lembrança de amigas e amigos em conversas paralelas dizendo coisas como: "Se um cara quer, vai até o inferno pra conseguir". E essa revelação, na verdade, nem doeu tanto. Ele não iria até o inferno por mim. Ele nem arriscou o caminho até a minha casa,
por favor.
Mais calma, ao entrar no Facebook algum tempo depois, tenho uma mensagem esperando para ser lida. Era o reconhecimento de 20% da mancada dele, e o resto um amontoado de desculpas que jogavam a culpa e a falta de bom senso em cima de mim.
Foi inevitável não pensar: "Tá de sacanagem?!", mas honestamente, nem desperdicei palavras. Minha resposta foi um "jóinha". E esse jóinha era um maduro:
"Poxa cara, bacana. Boa sorte na sua jornada, mas eu tô vazando da sua vida".
Não acho que ele entendeu. Ironia não é seu forte, a crítica sim. E é por isso que tenho a suspeita de que, em sua versão da história, consegui o papel de "vagabunda mimada", e tudo porque ele
só se atrasou por uma horinha...
Veja só. Tsc, tsc.